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A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza: uma cooperação internacional contra dois graves problemas da humanidade

[...] um novo fôlego para a luta contra a fome e a pobreza.

Por Cecília Laís* e Thiago Lima**

 

“O símbolo máximo de nossa tragédia coletiva é a fome e a pobreza […]”. As palavras, ditas pelo presidente Lula durante o lançamento oficial da Aliança, em novembro de 2024, ressoam com a missão assumida pela Política Externa do Brasil na construção da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. A Aliança tem sido considerada pelo governo e pela mídia em geral como a principal entrega da presidência brasileira do G20. O contexto para isso é mais que adequado e urgente. O último relatório sobre o estado da Segurança Alimentar e Nutricional (SOFI) da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), lançado em julho do ano passado estimou que entre 713 a 757 milhões (9,4% da população mundial) de pessoas tenham passado fome severa em 2023. São 152 milhões de pessoas a mais que em 2019. Em termos de insegurança alimentar grave ou moderada, os números globais são assustadores: 2,33 bilhões de pessoas foram registradas dentro da categoria – mais de dez ‘Brasis’ passando por algum grau de insegurança alimentar, ou seja, sem acesso a três refeições básicas diárias.
 

O que é a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza?

A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza nasce com votos de catalisar ações globais para atingir os ODS 1 e 2. Sua promessa é a de construir pontes entre países, organizações não-estatais e da sociedade civil que queiram contribuir com a implementação de políticas públicas e programas já testados e baseados em evidências. Ou seja: a Aliança não convida seus membros a embarcarem em aventuras. Ela oferece mapas com rotas conhecidas – políticas públicas e programas já testados – e que têm mais chances de levarem aos destinos esperados, especialmente se forem trilhadas com cooperação internacional. 
O documento fundacional da Aliança, utilizado de base para esse texto, é claro em afirmar sua missão: fornecer impulso de ordem política, financeira e técnica para atingir os objetivos de erradicação da fome e da pobreza. Através de um arranjo organizacional leve e que busca não se enrolar em amarras burocráticas, a Aliança dará ênfase a dois aspectos centrais. Primeiro, servir de mediadora, ‘costurando’ interesses e ações já existentes para acelerar o processo de erradicação da fome e da pobreza. É o que tem sido chamado de matchmaking.  
Segundo, para viabilizar o encontro de parceiros, a Aliança gerenciará dois tipos de informação. De um lado, seus membros descreverão quais políticas públicas ou programas querem implementar e/ou auxiliar na implementação. Essas descrições são classificadas em três pilares: o nacional, o do apoio financeiro e o do conhecimento. Apenas Estados e Organizações Regionais podem constar no pilar nacional. O financeiro e o de conhecimento estão abertos a todos os membros. De outro lado, a Aliança organizará uma “Cesta” com políticas públicas e programas cuja eficiência está atestada por evidências, e que podem ser ilustrados por “exemplos de país”. É importante destacar que a Aliança somente aproximará potenciais parceiros se encontrar intersecções nas políticas e programas já listados na Cesta. 

Os Pilares em mais detalhes e a Cesta

O Pilar Nacional trata da atuação dos próprios Governos Nacionais e Regionais, com a Aliança agindo no apoio à identificação de parceiros para implementação de políticas e programas de combate à fome e a pobreza. A implementação pode ser tanto nacional ou regional, no caso da União Europeia e da União Africana, e pode ser também a intenção de dar suporte a um membro que queira apoiar outro membro. Além disso, o documento também demonstra por diversas vezes uma preocupação da Aliança em dar foco aos grupos populacionais que serão impactados por essas políticas, inclusive em respeito aos próprios sistemas tradicionais de cada nação, fortalecendo o caminho para alcançar os ODS ao mesmo tempo que alavanca a resiliência desses grupos para o longo prazo. 
No Pilar do Apoio Financeiro, a lógica é mediar os esforços de financiamento para a execução de políticas e programas contra a insegurança alimentar e a pobreza. Esse financiamento pode vir através de várias frentes, desde organizações filantrópicas até organizações multilaterais que tenham interesse na ação. Válido aqui ressaltar que a Aliança em si não é um banco, fundo ou coisa semelhante. A Aliança utiliza o Pilar Financeiro para construir pontes que unirão duas pontas: países implementadores e organizações estatais e não estatais que queiram apoiar a implementação com dinheiro. 
Por fim, o pilar do Conhecimento é onde se concentram as informações sobre atores interessados no compartilhamento de lições e aprendizados. Trata-se de promover encontros entre governos implementadores e organizações vocacionadas para pesquisa e apoio técnico, viabilizando esforços que garantam uma cooperação o mais eficaz possível. 
O ponto de referência para encontro entre os membros da Aliança é a “Cesta de Políticas da Aliança”. Em termos simples, é um conjunto de programas e políticas públicas listados pela Aliança como referência para os governos nacionais, fornecendo descrições e detalhes técnicos para sua execução. O mais interessante, certamente, é o fato de que essas políticas da Cesta correspondem a políticas já implementadas e bem executadas, trazendo para o centro da discussão as experiências bem-sucedidas mundo afora e facilitando sua proliferação. Assim, a Cesta e os três pilares conversam entre si e são interdependentes em certo grau. 

A coordenação dos trabalhos

Para coordenação dessas frentes, a Aliança se estrutura em três esferas. I) O Mecanismo de Apoio, composto por um corpo técnico responsável por funções de ordem organizacional, incluindo o gerenciamento de informações, a realização de contatos e a intermediação de acordos.  II) Conselho de Campeões, composto por um grupo de até 50 integrantes, dentre países, organizações internacionais e da sociedade civil. É ao Conselho que o Mecanismo de Apoio se reporta. Ele também definirá regras e procedimentos de decisão para o trabalho do Mecanismo. Além disso, caberá aos Campeões difundirem a missão da Aliança e fornecerem apoio político para a conclusão de acordos. Por fim, III) a Cúpula contra a Fome e a Pobreza é um encontro no qual seus membros discutirão avanços, problemas e as ações rumo aos ODS 1 e 2.  


Mapa Mental: Aliança Global contra a fome e a pobreza. / https://globalallianceagainsthungerandpoverty.org/pt-br/fact-sheet/

 

Considerações Finais

A Aliança, apesar de recém-nascida, traz uma renovação de votos e um novo fôlego para a luta contra a fome e a pobreza. É simbólico ver o Brasil, que no último ano tirou mais de 14 milhões de pessoas da fome (FAO, 2024), de volta ao posto de país relevante nas Relações Internacionais e que propõe ações para erradicar a fome e a pobreza. Parece que o mundo também percebe isso: A Aliança nasce sob a presidência brasileira do G20, mas já conta com mais de 90 países filiados, além de organizações estatais e não estatais, somando mais de 150 membros. 
Para a Política Externa Brasileira, será importante observar se o tema continuará presente e em alto nível na COP30, a ser sediada no Pará em novembro, e com a presidência do Brasil nos BRICS, iniciada neste mês. Assim, 2025 promete fornecer uma janela de oportunidade excelente para fortalecer a agenda de combate à fome e à pobreza. 
Por fim, resta-nos agora esperar – e esperançar – para que os votos de sucesso à Aliança sejam convertidos em interesse coletivo concreto. Para isso, será fundamental mantê-la em alta prioridade nas agendas internacionais, bem como dotá-la de funcionários públicos internacionais fortemente motivados no trabalho em prol da erradicação da fome e da pobreza. 

*Cecília Laís – Graduanda em Relações Internacionais e membra do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais (FomeRI) da UFPB

**Thiago Lima – Coordenador do FomeRI e prof. do Departamento de Relações Internacionais da UFPB. Foi coordenador na Força Tarefa para o estabelecimento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.

 

***A opinião contida neste texto não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Paraíba.

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