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A cidade planejada não planeja mais a Política Educacional

Falta de planejamento afeta ainda mais as periferias do DF

Assistimos com tristeza ao pronunciamento da Secretária de Educação do Distrito Federal, Hélvia Paranaguá, no início de janeiro, em que a chefe da pasta responsabilizou os estudantes autistas pela falta de vagas na rede pública de ensino e pela ausência de vagas próximas às residências das famílias.

Essa fala me levou a revisitar o Plano de Construções Escolares de Brasília, elaborado por Anísio Teixeira, e convido-os a conhecer este documento histórico para esclarecer que a verdadeira responsável pela falta de vagas no DF e pela queda da qualidade da educação é a ausência de planejamento governamental.

É estarrecedor o posicionamento da Secretária, tanto pelo fomento à discriminação quanto pela culpabilização dos estudantes pela falta de planejamento que é de sua responsabilidade, evidenciando a total ausência de profissionalismo na gestão do mandato do governador Ibaneis Rocha no DF.

Ao analisar a história de Brasília, a cidade conhecida pelo rigoroso planejamento de sua construção, encontramos um modelo educacional que integrava as escolas ao projeto urbano, considerando a educação essencial para o desenvolvimento nacional. No entanto, a atual gestão ignora os parâmetros de uma política educacional de qualidade para o DF, abandonando os pressupostos que orientaram a educação desde os primeiros anos de construção da capital.

Em 1961, Anísio Teixeira publicou o Plano de Construções Escolares de Brasília, defendendo uma escola pública, gratuita, laica e de qualidade, capaz de enfrentar as desigualdades sociais que nossa sociedade enfrentava — e ainda enfrenta. O intelectual acreditava que um maior tempo no ambiente escolar resultaria no desenvolvimento positivo de crianças e jovens. Dessa visão nasceram a escola-parque e as propostas de espaços culturais nos complexos escolares.

Inspirado no Manifesto dos Pioneiros da Educação de 1932, o projeto articulava-se ao plano urbanístico de Lúcio Costa e à pedagogia da Educação Nova. Segundo Anísio Teixeira, “o plano de construções escolares para Brasília obedeceu ao propósito de abrir oportunidade para a Capital Federal oferecer à Nação um conjunto de escolas que pudessem constituir exemplo e demonstração para o sistema educacional do País”.

Inicialmente, o plano era pensado para o Projeto do Plano Piloto, mas logo passou a balizar o planejamento das demais Regiões Administrativas (RA), como Gama e Taguatinga. A resistência e luta dos trabalhadores da Nova Capital também se manifestaram na demanda por escolas. Foi na Candangolândia que, em 1967, inaugurou-se a primeira escola da capital.

O plano de Anísio Teixeira propunha uma arquitetura escolar que incluía jardins de infância e escolas-classes integrados às quadras residenciais, próximos das moradias dos estudantes.

As escolas-parque seriam unidades de ensino focadas em artes e esportes no contraturno do ensino regular, cumprindo papel essencial na proposta educacional. Já o ensino médio seria oferecido em Centros de Educação Média, compostos por estruturas destinadas a cursos de humanidades, técnicos, comerciais e científicos, além de quadras de esportes, piscinas, campos de futebol, teatros, bibliotecas e museus.

Em termos territoriais, previa-se que, para cada grupo de quatro quadras, houvesse uma escola-parque destinada a atender cerca de 2 mil alunos, oriundos de quatro escolas-classes. As atividades incluíam oficinas de artes industriais, como tecelagem, cerâmica e cartonagem, além de práticas culturais e esportivas.

A quantidade de escolas seria definida com base na densidade das quadras habitadas, garantindo não apenas escolas para o currículo acadêmico, mas também espaços voltados às artes, ao esporte e à cultura.

Plano não implementado

Entretanto, o plano nunca foi plenamente implementado, sobretudo fora do Plano Piloto. Regiões Administrativas como Gama, com 137.331 habitantes, e Taguatinga, com 210.498, não receberam escolas-parque nem jardins de infância suficientes. Mesmo no Plano Piloto, a demanda populacional superou a capacidade das escolas existentes.

Nas regiões de crescimento mais recente, como Itapoã (65.373 habitantes) e Riacho Fundo II (70.998 habitantes), o distanciamento do Plano de Construções Escolares tornou-se ainda mais evidente. O Itapoã, por exemplo, possui apenas três escolas-classes, enquanto o Riacho Fundo II conta com dez.

Fica evidente que, além do abandono do Plano Escolar do DF pelas últimas gestões, houve a renúncia à ideia de planejamento de políticas educacionais. Grandes áreas habitacionais vêm sendo projetadas sem escolas, bibliotecas, quadras ou espaços culturais, ignorando os princípios pedagógicos e arquitetônicos que nortearam a concepção de Brasília e do Currículo em Movimento.

Essa falta de planejamento afeta ainda mais as periferias do DF – a escola pública é essencial para as famílias – e demonstra a negligência do Estado em garantir o acesso à educação, negligenciando não apenas o Plano Escola de Anísio Teixeira, mas as necessidades sociais como Creche e Educação em Tempo Integral.

A Educação é um direito de todos e o Estado tem o dever de ofertar com eficiência. Este governo tem deixado de agir, privando nossa infância e juventude de uma educação pública, gratuita e de qualidade, comprometendo o futuro da capital e perpetuando desigualdades sociais.

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*Suelen Gonçalves dos Anjos é membro do Coletivo Família Hip Hop, professora da Secretaria de Estados de Educação do DF e da Universidade do Distrito Federal (UnDF).

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha do editorial do jornal Brasil de Fato – DF.

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