Você já ouviu falar por aí que a mesma empresa que produz agrotóxicos/agroquímicos, famigerado veneno, na agricultura, é a que também produz medicamentos?
Se já ouviu, temos um bom ponto de partida, se é novidade, saiba que o nome desse grupo é Bayer, ela comprou a multinacional Monsanto recentemente, a maior produtora de glifosato. Em seu site, na mesma aba que vemos um possível técnico agrícola em uma lavoura de monocultura escrito “agrícola” logo abaixo, nos outros dois lados vemos a foto de uma cientista escrito “farmacêutica” e do outro um casal heterossexual segurando uma garrafa de Bepantol, escrito “saúde do consumidor”.
Não gera um estranhamento essa conjunção de imagens e papéis as quais a indústria diz se prestar? A Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer (AIPC), órgão ligado à Organização Mundial da Saúde publicou um relatório em que confirma que o glifosato é um agente potencialmente causador de câncer. Isso quer dizer que a mesma indústria que produz o câncer, produz medicamentos para curá-lo?
Reprodução / Bayer
Para entender melhor essa lógica, um conceito muito importante é Determinantes Comerciais de Saúde. Mas o que seria isso? É quando grandes corporações, grandes empresas, ou seja, o setor privado, a partir de seus interesses, usufrui de estratégias e aproximações que promovem escolhas e produtos que são prejudiciais à saúde, em níveis individuais e globais. Assim fica fácil entender que, quando falamos do interesse dessas empresas, estamos falando do lucro ainda que este apresente-se como antagônico ao bem-estar.
Não importa se o glifosato ou se as comidas ultraprocessadas geram problemas na saúde, a finalidade dessas empresas é garantir seu excedente. Segundo pesquisa publicada pela revista The BMJ, esses alimentos estão associados a um maior risco de agravos de saúde, totalizando 32. Entre esses o câncer, morte precoce, doenças cardíacas e pulmonares.
Em síntese, falar de saúde e de sua relação com as empresas é falar de um modelo de organização da sociedade que explora a natureza e os seres humanos em nome do lucro.
Neste mês, 60% do território nacional ficou abaixo de fumaça, uma fumaça carregada de substâncias tóxicas que irritam as narinas, olhos e garganta, além de atravessarem as células pulmonares e entrarem na circulação sanguínea, causando problemas respiratórios, sobretudo naqueles já possuem comorbidades pré existentes.
Todos esses exemplos mencionados, o glifosato, os alimentos ultraprocessados e as queimadas no Brasil, possuem um nó: o desejo desenfreado pelo lucro de uma pequena parcela de ricos. Esse lucro está acima da saúde e do bem-estar da população brasileira.
Ainda que reformas e um sistema universal de saúde se coloquem como essenciais para assegurar qualidade de vida aos brasileiros e brasileiras; é preciso compreender que grande parte dos dilemas e soluções para os agravos de saúde situam-se para além do setor da saúde.
Isso significa dizer que para romper com esse ciclo de adoecimento é necessário – e urgente – construirmos um novo modelo econômico que não seja alicerçado no excedente da riqueza, e na superexploração e no lucro, e sim na produção do necessário, na garantia de alimentos sem agroquímicos e em relações de trabalho justas e igualitárias para todos e todas, com jornadas de trabalho menores, empregando assim, mais pessoas. Lutar por saúde, é lutar pelo fim do capitalismo.
1. https://www.thelancet.com/journals/langlo/article/PIIS2214-109X(16)30217-0/fulltext
2. https://www.scielo.br/j/csc/a/7M7rFXFfj4xrjcCBwgh9pwr/?lang=en
3. https://www.fsp.usp.br/nupens/evidencias-cientificas-associam-alimentos-ultraprocessados-a-morte-precoce-e-mais-de-30-agravos-a-saude-humana/
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*Ana Keil: fonoaudióloga especialista em realidade brasileira e militante do Levante Popular da Juventude.
*Maria Clara Cristóvão Radi: assistente social e militante do Levante Popular da Juventude.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.